OS “ELES” QUEREM NOS FAZER CRER
que os níveis elevados de mortes por acidentes – ou seriam incidentes – do
trabalho são perfeitamente normais, no Brasil. E que as ocorrências derivam de
culpa exclusiva do trabalhador em não observar as normas de segurança ou,
então, por consequência do acaso. É o caso das construções de estádios para a
Copa, em que passa de 230 o número de mortes, superando com margem inalcançável
o registro de vítimas dos países sedes desde 1970, no México. Enquanto isso as
grandes empreiteiras superfaturam seus lucros devido à economia feita com a
relativização dos procedimentos de segurança e a ausência ou insuficiência de
equipamentos de proteção individual e coletivo para o trabalhador
brasileiro.
Diferentemente,
dá-se, porém, com os pequenos ambulantes escalados para venderem suas “mingongas” nas imediações das arenas. Forçados a atender
padrões onerosos de higiene se quiserem trabalhar honestamente, como no caso
das Baianas do Acarajé, em Salvador, obrigadas a abandonarem procedimentos
tradicionais de feitura do quitute para se adaptarem ao paladar exigente dos
convidados dos “Eles” e da FIFA. Ao passo que esta se matem conivente com o
trabalho insalubre e periculoso nos países sedes, quando não escravocrata como
no caso do Catar, próxima sede do Mundial.
Diante
disso, ouvir de uma pessoa leiga: “Se no Brasil se impõe regras rígidas de
higiene e segurança para evitar indigestões causadas pela “comilança” de
quitutes exóticos, mas, ao mesmo tempo, flexibiliza normas imprescindíveis à
integridade do trabalhador da construção de estádios de futebol, a fim de
garantir a ganância de empreiteiras corruptas, então está sacramentada a
insignificância do cidadão perante o Estado Brasileiro”. Os construtores e
outras pessoas letradas a serviço dos “Eles” dirão que, pela envergadura e
importância de um evento como a copa, o brasileiro precisa doar sua cota de
sacrifício, porque a partir de agora o mundo verá o Brasil de forma respeitosa.
E
quanto aos familiares dessas vítimas da ganância e da negligência, abandonados
à própria sorte porque, no Brasil, a ocasião definida pelos “Os Eles” é quem
determina, conforme os interesses em jogo, que lei deve ou não ser
respeitada, entenderão eles, algum dia, que por ser o sujeito pobre apenas
uma peça nesse macabro jogo de concentração de riquezas, o Estado tem
legitimidade presumida para aniquilá-los, uma vez que os desvalidos sempre são
legalmente matáveis? E que, quando se
fala em proteção ao trabalho, quer-se, ao mesmo tempo, dizer que somente são
viáveis as medidas de segurança que não importem em entraves para o progresso?
Por
essas e outras, é que a relação capital e trabalho no Brasil foi sempre
perversa. Pois, contribui de maneira decisiva e cruel para ampliar o abismo
entre empregados e patrões, locupletando estes e condenando à miséria quem
precisa vender sua força de trabalho. Enquanto isso, vai-se convencendo a
famigerada classe média acrítica dos discursos pré-fabricados pela grandiloquência
“Dos Eles” , a fim de que o trabalhador se resigne ante as mortes evitáveis na
construção de estádios para o deleite e manutenção do “status Quo” de uma
classe parasitária e indiferente ao sofrimento das famílias vitimadas pelo
desprezo e o lucro voraz.
ENTÃO,
como se dizem os tecnocratas: “O progresso exige do povo sacrifício e
perseverança”, além do mais, não é, conforme profetizou o estandarte do futebol
brasileiro, com hospitais e obediência às Leis trabalhistas que se faz uma
invejável Copa do Mundo, e, sim, com arenas imponentes e faraônicas, ainda que
a custa de vidas de honestos pais de famílias. Entretanto, temos um consolo: O
Catar supera nosso número de 234 mortos. EU É QUE NÃO ACREDITO MAIS NOS “ELES”.
E VOCÊ?