ANARQUISMO: Princípios, ideologia e os movimentos.
A Anarquia
Para a anarquia vai a humanidade
Que da anarquia a humanidade vem!
Vide como esse ideal do acordo invade
As classes todas pelo mundo além!
Que importa que a fração dos ricos brade
Vendo que a antiga lei não se mantém?
Hão de ruir as muralhas da Cidade,
Que não há fortalezas contra o bem
Façam da ação dos subversivos crime,
Persigam, matem, zombem... Tudo em vão...
A ideia, perseguida, é mais sublime,
Pois nos rudes ataques à opressão,
A cada herói que morra ou desanime
Dezenas de outros bravos surgirão.
ENSAIO SOBRE O ANARQUISMO
Por Adão Lima de Souza
“Quem
quer que seja que ponha as mãos sobre mim, para me governar, é um usurpador, um
tirano. Eu o declaro meu inimigo”. (Pierre-Joseph Proudhon)
1.0.
INTRODUÇÃO
As origens do movimento
derivam da concepção individualista dos direitos naturais, defendida por John
Locke. Para o filósofo inglês, haveria um contrato voluntário acordado entre
indivíduos iguais em direito e em deveres. Os anarquistas e os liberais extraíram
das ideias de John Locke profundas implicações políticas, isso no final do
século XVIII, quando surge um movimento anarquista estruturado, como uma
corrente política autônoma e com seguidores em todo mundo.
Dentre os teóricos mais
conhecidos, conta-se William Godwin (1773-1836), P.J.Proudhon
(1809-1865), Bakunine (1814-1870), Kropotkin (1842-1921).
Os anarquistas se
caracterizaram pela pouca inclinação à constituição de grandes organizações,
formando grupos dispersos, porém, lutando basicamente em torno de seis ideias:
a) Direitos fundamentais dos
indivíduos - cujo conceito se traduz na ideia da primazia do indivíduo face à
sociedade. Todo o indivíduo é único e possui um conjunto de direitos naturais
que não podem ser posto em causa por nenhum tipo de sociedade que exista ou
venha a ser criada.
b) Ação direta- Conceito
que rejeita o sistema de representação, ressaltando o valor da ação direta do
indivíduo na realidade social. Alguns anarquistas, no final do século XIX e
princípios do século XX, cometiam assassinatos de figuras políticas baseados
neste conceito, entendendo que tais líderes simbolizarem tudo aquilo que
reprovavam.
c) Crítica aos preconceitos
ideológicos e morais- Os anarquistas entendiam que era imprescindível destruir
todas as condicionantes mentais que possam impedir o indivíduo de ser livre e
de se assumir como tal.
d) Educação libertária- A
educação é um processo de emancipação dos indivíduos, e por esta via podiam
lançar as bases de uma nova sociedade.
e) Auto-organização- Embora
recusem qualquer forma de poder, a maioria dos anarquistas estabelecem
organizações próprias, que devem, contudo, ser resultado de uma ação consciente
e voluntária dos seus membros, mantendo uma total igualdade de forma a impedir
a formação de relações de poder entre os membros da comunidade.
f) Sociedade global- Um dos
grandes ideais anarquistas é a constituição de uma sociedade planetária que
permitisse a livre circulação de pessoas ou o fim das guerras entre países.
2.1.
Conceitos e definições:
O
termo anarquismo deriva da palavra grega anarkhos, e pode ser traduzido,
pela proximidade semântica que encerra, como “an”; sem, arkhos; governo. Ou
seja, significa nos parâmetros da língua portuguesa: "ausência de
governo".
Politicamente,
representa o sistema social ideal, no qual o bem comum resultaria da coerente
conjugação dos interesses de cada indivíduo. Porém, sem a tradicional divisão
em classes e, por consequência, uma sociedade livre de toda a espécie de
opressão de uns sobre os outros.
Portanto,
a situação política em que a Constituição - Direitos e Deveres - enquanto ditadora de normas destinadas a
dirigir o comportamento das pessoas perde sua razão de existir, por ser
estanque e imposta pela vontade de uma classe sobre a outra.
2.2. O que é Anarquismo:
Anarquismo é o
movimento político que propugna pela implantação da anarquia como sistema
mediador das inter-relações sociais, ou
seja, defende a supressão de todas as formas de dominação e opressão vigentes na
sociedade moderna, buscando o fim do Estado e de sua autoridade, a fim de
concretizar uma comunidade homens e mulheres livres, mais fraterna e
igualitária
De modo geral, a anarquia
repudia qualquer tipo de ordem hierárquica que não seja livremente aceita pelos membros de organizações
libertárias baseadas na livre associação.
Por esta razão, anarquia
significa ausência de coerção e não a inexistência de ordem. O que não se
traduz em sinônimo de caos como pretendem aqueles que, partindo de uma noção
equivocada da literalidade do termo grego, popularizaram esta distorção
terminológica, desde o fim do século XIX, através dos poderosos meios
comunicação de massa para difundir os princípios do Capitalismo veiculados pela
propaganda patronal e das instituições políticas e religiosas, em suas
campanhas antianarquistas.
Ademais, é também frequente
o anarquismo ser apontado como uma ideologia negadora dos laços de
solidariedade (indiferença) entre os homens, quando, em realidade, um dos laços
mais valorizados pelos anarquistas é o auxílio mútuo, em que pese combater os
valores sociais e políticos prevalecentes no mundo moderno como Estado, ainda
que laico, a Lei, a ordem verticalizada, a religião e a propriedade privada.
Por fim, o anarquismo propõe
um esforço individual, a fim de conciliar interesses pessoais e sociais de seus
adeptos, a partir de um árduo trabalho de conscientização dos indivíduos.
Concluindo, o anarquismo é
uma filosofia política que engloba teorias, métodos e ações objetivando a
supressão total e imediata de todas as formas de governo compulsório e de Estado.
2.3.
Vertentes do pensamento anarquista:
Quando
se fala em “anarquia”, muitos acreditam que a expressão pode ser associada com
propriedade a qualquer evento ou lugar em que a desorganização impere. Contudo,
essa apropriação contemporânea dista bastante das teorias que integram o
pensamento anarquista, estabelecido para combater as contradições e injustiças
do sistema capitalista pujante já no século XVIII.
Entretanto, perfeitamente possível distinguir as várias escolas do pensamento anarquista em correntes individualistas e correntes coletivistas no que se refere ao problema da propriedade privada, do qual derivam os conflitos sociais instaurados por séculos a fio.
Pois, entre as diversas
escolas de pensamento e tradições de anarquismo, as quais não são mutuamente
exclusivas, cada vertente do anarquismo tem uma linha de compreensão, análise,
ação e edificação política específica, embora todas vinculadas pelos ideais
básicos do anarquismo.
Assim, as correntes do
anarquismo, são divididas em anarquismo social e anarquismo individualista, ou
em classificações semelhantes.
A maioria dos anarquistas se
opõe a todas as formas de agressão, apoiando, em contrapartida, a autodefesa ou
a não violência (anarcopacifismo); outros, contudo, apoiam o uso de outros
meios, como a revolução violenta. Enquanto que os defensores movimento da
Propaganda pelo Ato, inicialmente violento, hoje em dia incorporou diversos
tipos de ações não violentas.
Face ao problema da
propriedade dos meios de produção, há correntes individualista e coletivista:
2.3.1.
Os individualistas:
Segundo esta corrente, o
anarquismo recusa a reforma progressiva como meio de desenvolvimento do Estado,
o qual deverá ser fruto da destruição radical da ordem estatal, através da ação
direta, que inclui os atentados (propaganda pela ação).
A Propaganda pelo Ato foi a
maior expressão do anarquismo individualista. Chegando alguns anarquistas a
acreditarem, como Johann Most, que a divulgação de atos violentos de retaliação
aos contrarrevolucionários era mais viável porque "Se proclamava não
apenas ação em e para si mesma, mas também ação como propaganda”.
Deste modo, por volta dos
anos 1880, a frase "propaganda pelo ato" tinha começado a ser
utilizada tanto dentro quanto fora do movimento anarquista para se referir a
bombardeios individuais, regicídios e tiranicídios.
A ponto de o
anarcossindicalista Fernand Pelloutier argumentar em 1895 pelo envolvimento de
renomados anarquistas no movimento trabalhista, baseando-se em que o anarquista
não poderia ir bem sem "o dinamitador individual”.
Todavia, em 1887, figuras
importantes no movimento anarquista distanciaram-se de tais atos individuais. E
passaram a advogar o abandono desse tipo de táticas em favor de uma ação
coletiva revolucionária, por exemplo, através do movimento sindical, por
entenderem que, como escreveu Peter Kropotkin
em Le Révolté que "uma estrutura baseada em séculos de
história não pode ser destruída com alguns quilos de dinamite".
Entretanto, deve-se
salientar que a repressão do Estado (incluindo as lois scélérates
francesas de 1894) contra os movimentos anarquistas e trabalhistas, apesar de
poucos bem-sucedidos bombardeios e assassinatos contribuírem para o abandono
desse tipo de táticas, reciprocamente, a repressão estatal, primeiramente,
propiciou esses atos isolados.
A partir da separação do
movimento socialista em muitos grupos e, após a supressão da Comuna de Paris em
1871, a execução e exílio de muitos communards para colônias penais,
expressões e atos políticos individuais foram desencadeados.
2.3.2. Os coletivistas:
O anarquismo social têm
valores e evolução diferentes. Enquanto que a corrente individualista do
anarquismo enfatiza as liberdades mais radicais como, por exemplo, a oposição
ao estado ou ao controle social deste sobre o indivíduo, a vertente social
enfatiza a liberdade positiva para alcançar o potencial do homem e argumenta
que humanos têm necessidades que a sociedade deveria preencher totalmente,
"reconhecendo igualdade de direitos".
Assim
sendo, o
Anarquismo Social se define como um sistema de propriedade pública dos meios de
produção e controle democrático de todas as organizações, sem qualquer
autoridade governamental ou coerção.
É, por isso, a maior escola
de pensamento no anarquismo. Porque, ao mesmo tempo em que rejeita a propriedade
privada, vendo-a como a fonte da desigualdade social, propõe como substituto a
essa agressão contra o indivíduo, pela existência do Estado institucionalizada,
a cooperação e a ajuda mútua.
O Anarquismo Coletivista,
também chamado de "socialismo revolucionário" ou “socialismo
libertário”, ou, ainda, “anarcocomunismo” propõe que a forma mais livre de
organização social seria uma sociedade composta por comunas autogeridas, com
uso coletivo dos meios de produção, organizada democraticamente, e relacionada
às outras comunas através de federação.
Enquanto alguns
anarcocomunistas preferem a democracia direta, outros sentem que o seu caráter
majoritário pode impedir a liberdade individual e então estes apoiam uma
democracia consensual. No anarcocomunismo, assim como o dinheiro seria abolido,
indivíduos não receberiam compensação direta pelo trabalho (através do
compartilhamento dos lucros ou pagamentos), mas teriam livre acesso aos
recursos e ao excedente da comuna.
O anarcocomunismo nem sempre
tem uma filosofia comunitária. Algumas formas de anarcocomunismo são egoístas e
fortemente influenciadas por individualismo radical, acreditando que o
anarcocomunismo não requer inteiramente uma natureza comunitária.
O anarquismo coletivista
surgiu contemporaneamente ao marxismo, mas se opôs à ditadura do proletariado
marxista, apesar de aceitar o objetivo marxista de uma sociedade coletivista
sem classes. Ideias anarcocomunistas e anarquistas coletivistas não são
mutuamente exclusivas; apesar de os anarquistas coletivistas defenderem
compensação pelo trabalho, alguns estenderam a possibilidade de uma transição
pós-revolucionária para um sistema comunista de distribuição de acordo com a
necessidade.
O Anarquismo Coletivista, em
sua forma mais revolucionária, é comumente associado a pensadores como Mikhail
Bakunin e Johann Most. Estes defendiam o fim imediato de toda propriedade
privada dos meios de produção, opondo a este mecanismo cruel de divisão da
riqueza a propriedade coletivizada.
E isto, só poderia ser
alcançado através de uma revolução violenta. Primeiramente, começando com um
grupo pequeno e coeso através de atos de violência, ou "propaganda pelo
ato", o que inspiraria trabalhadores como um todo a se revoltar e
coletivizar forçadamente os meios de produção.
Entretanto, a coletivização
não era para ser estendida para a distribuição das receitas, já que os
trabalhadores seriam pagos de acordo com o tempo trabalhado, mais do que
receber bens distribuídos de "acordo com a necessidade" como no
anarcocomunismo.
Essa posição foi criticado
por anarcocomunistas como efetivamente "assegurando o sistema de
salários".
No começo do século XX,
outra forma de anarquismo coletivista, o anarcossindicalismo surgiu como uma
vertente distinta dentro do anarquismo. Com grande foco no movimento
trabalhista, o sindicalismo anarquista coloca sindicatos radicais como uma
força potencial para uma mudança social revolucionária, substituindo o
capitalismo e o estado por uma nova sociedade, democraticamente autogerida por
trabalhadores.
É frequentemente combinado
com outras formas de anarquismo, e anarcossindicalistas frequentemente aceitam
os sistemas econômicos anarcocomunistas ou anarquistas coletivistas. Tendo como
pensador inicial Rudolf Rocker, cujo panfleto de 1938 “Anarcossindicalismo”
delineia uma visão da origem do movimento, objetivando a importância do
trabalho para o futuro.
2.3.3. Correntes
pós-clássicas
O anarquismo continua a
gerar muitos filósofos e movimentos, às vezes ecléticos, baseando-se em várias
fontes, e sincréticos, combinando conceitos diferentes contrários para criar
novas abordagens filosóficas. Desde a nova onda do anarquismo nos Estados
Unidos, nos anos 1960, novos movimentos e escolas têm emergido.
O anarcafeminismo
desenvolveu-se como uma síntese do feminismo radical e do anarquismo, que vê o
patriarcado (dominação masculina sobre as mulheres) como uma manifestação
fundamental de governos compulsórios. Ele foi inspirado por escritas do século
XIX das primeiras anarquistas feministas como Lucy Parsons, Emma Goldman,
Voltairine de Cleyre e Dora Marsden.
Anarcafeministas, como
outras feministas radicais, criticam e defendem a abolição dos conceitos
tradicionais de família, educação e do papel social de gênero.
O anarquismo verde (ou
eco-anarquismo) é uma escola de pensamento dentro do anarquismo que coloca
ênfase em debates ambientais, e cujas principais correntes contemporâneas são o
anarcoprimitivismo e a ecologia social.
O anarcopacifismo é uma
tendência que rejeita o uso da violência na luta por mudança social. Ele se
desenvolveu "principalmente nos Países Baixos, no Reino Unido e nos
Estados Unidos, antes e durante a Segunda Guerra Mundial".
Anarquismo pós-esquerdismo é
uma tendência que procura distanciar-se da tradicional esquerda política e
escapar da restrição de ideologias em geral.
O pós-anarquismo é um
movimento em direção à síntese da teoria anarquista clássica e do pensamento
pós-estruturalista baseando-se em diversas ideias, incluindo o pós-modernismo,
marxismo autonomista, anarquismo pós-esquerdismo, situacionismo e
pós-colonialismo.
2.4.
História do Anarquismo
O anarquismo foi
desenvolvido pelo clérigo dissidente inglês William Goldwin(1756 - 1836) e pelo jovem Proudhon, e recebeu uma base
filosófica da parte de Max Stirner. E teve como os seus seguidores mais
importantes entre os primeiros russos social-revolucionários (niilismo),Bakunin
e o príncipe Kropotkin, e Tolstoi na sua
vertente religiosa.
Estes e outros pensadores como Enrico Malatesta,
profundando as discussões de natureza anárquica, ainda no século XIX, tentaram
trilhar caminhos que pudessem conceber uma sociedade plenamente libertária.
Em 1793, William Godwin, que
tem frequentemente sido citado como o primeiro anarquista, escreveu Justiça
Política, que alguns consideram ser a primeira expressão do
anarquismo.
Godwin, um filósofo
anarquista de uma base racionalista e utilitarista, opôs-se à ação
revolucionária e viu um estado mínimo como um "mal necessário"
presente que se tornaria cada vez mais irrelevante e sem poder pela propagação
gradual de conhecimento.
Godwin advogou um
individualismo extremo, propondo que toda a cooperação no trabalho fosse
eliminada na premissa de que isso seria o mais conducente ao bem geral. Era um
utilitarista que acreditava que todos os indivíduos não são de valor igual, com
alguns de nós "de mais valor e importância" do que outros, dependendo
da nossa utilidade em trazer bem social.
Portanto, ele não acredita
em direitos iguais, mas na vida da pessoa, e que deveria ser favorecida a que é
mais contribuinte para o bem social. Era opositor do governo porque o viu
infringindo o direito individual de "julgamento privado" para
determinar quais ações mais maximizam a utilidade, mas também fez uma crítica
de toda autoridade sobre o julgamento do indivíduo.
Esse aspecto da filosofia de
Godwin, privado de motivações utilitárias, foi desenvolvido em uma forma mais
extrema posteriormente por Stirner.
A forma mais extrema do
anarquismo individualista, chamada de "egoísmo",ou anarquismo
egoísta, teve como expoente um dos primeiros e mais bem conhecidos proponentes
do anarquismo individualista, Max Stirner.
O Ego e sua propriedade de
Stirner, publicado em 1844, é o texto fundador dessa filosofia. De acordo com
Stirner, a única limitação dos direitos do indivíduo é o seu poder para obter o
que ele deseja, sem considerar Deus, estado ou moralidade. Para Stirner,
direitos eram espectros na mente, e ele afirmava que a sociedade não existe,
mas sim que "os indivíduos são a sua realidade".
Stirner defendia a
auto-afirmação e previa uniões de egoístas, associações não-sistemáticas
continuamente renovadas pelo apoio de todos os partidos através de um ato de
vontade, que
Stirner propôs como uma
forma de organização no lugar do estado.
Anarquistas egoístas afirmam
que o egoísmo irá alimentar uma união genuína e espontânea entre os indivíduos.
Relativamente à sua
organização, há uma corrente anarcocoletivista (bakuninista) e outra
anarcocomunista (kropotkiana), que se opunha aos sindicatos de classes
operárias.
Conclui-se,
portanto, que em pleno auge das teorias liberais defendidas pelo pensamento
iluminista, o Anarquismo surge como alternativa capaz de propor, naquela época,
um novo tipo de arranjo social em que as pessoas não estivessem subordinadas à
força dos governos e das Leis.
Mas,
sim, em sua perspectiva, os anarquistas acreditavam, num contexto dominado por
princípios racionais, e equilibrado entre as necessidades e as vontades, ser
possível conduzir a vida em sociedade sob os pilares da liberdade individual e
da responsabilidade coletiva, mediante o fim da propriedade privada.
2.5.
Os movimentos Anarquistas
Alguns consideram que temas
anarquistas podem ser encontrados em trabalhos dos filósofos taoísta Lao Zi e
Chuang-Tzu. O último tem sido traduzido nestes termos:
"Há
uma coisa como deixar a humanidade sozinha; nunca houve tal coisa como governar
a humanidade [com sucesso]," e "Um pequeno ladrão é colocado
na cadeia. Um grande bandido torna-se o governante de uma nação".
Enquanto que o
anarquismo moderno é apontado, contudo, como tendo origem no pensamento secular
ou religioso do Iluminismo, particularmente de argumentos de Jean-Jacques
Rousseau para a centralidade moral da liberdade ou em William Godwin,
considerado aquele que desenvolveu a primeira expressão do pensamento
anarquista moderno, pelo que se observa nos escritos de Peter Kropotkin: " Godwin foi o primeiro a formular as
concepções políticas e econômicas do anarquismo, mesmo que ele não tenha dado
nome às ideias desenvolvidas em seu trabalho".
E enquanto Godwin ligava
suas ideias anarquistas a Edmund Burke. Benjamin Tucker creditava a Josiah
Warren, um estado-unidense que promovia a ausência do estado e comunidades
voluntárias onde todos os bens e serviços são privados, como sendo "o
primeiro homem a expor e formular a doutrina agora conhecida como
anarquismo."
Todavia, de fato, o primeiro
a descrever-se como um anarquista foi Pierre-Joseph Proudhon, um filósofo e
político francês, chamado por alguns de fundador da teoria anarquista moderna.
2.6.
O Anarquismo na História:
O anarquismo desempenhou
papéis significativos nos grandes conflitos da primeira metade do século XX.
Durante a Revolução Russa de 1917, Nestor Makhno tenta implantar o anarquismo
na Ucrânia, com apoio de várias comunidades camponesas, mas essas comunidades de homens livres acabam
derrotadas pelo Estado bolchevique truculento de Lênin.
Porém, quinze anos depois,
anarquistas organizados em torno de uma confederação anarcossindicalista
impedem que um golpe militar fascista seja bem sucedido na Catalunha (Espanha),
e são os primeiros a organizar milícias para impedir o avanço do fascismo na
consequente Guerra Civil Espanhola.
Durante o curso da Guerra
Civil Espanhola, os anarquistas controlaram um grande território que
compreendia a Catalunha e Aragão, onde se incluía a região mais industrializada
de Espanha, sendo que a maior parte da economia passou a ser autogerida por comissões de trabalhadores.
Após a Segunda Guerra
Mundial, o movimento anarquista deixou de ser um movimento de massas, e perdeu
a influência que tinha no movimento operário dos vários países europeus.
Entretanto, continuaria a
influenciar revoltas populares que se seguiram na segunda metade do século XX,
como o Maio de 68 na França, o movimento anti-Poll tax no Reino Unido e os
protestos contra a reunião da OMC em Seattle, nos Estados Unidos, nos dias
atuais.
2.7. A Primeira
Internacional
Na Europa, uma severa reação
seguiu a revolução de 1848, durante a qual dez países tinham experimentado
convulsões sociais breves ou longas assim como grupos defendendo elevações
nacionalistas.
Depois de a maioria dessas
tentativas sistematicamente acabar em fracasso, elementos conservadores tiraram
vantagem de grupos divididos de socialistas, anarquistas, liberais e
nacionalistas, para impedir mais revoltas.
Em 1864, a Associação
Internacional dos Trabalhadores (algumas vezes chamada de "Primeira
Internacional") uniu diversas correntes revolucionárias, como seguidores
franceses de Proudhon, , blanquistas, filadélfios, sindicalistas ingleses,
socialistas e sociais democratas.
Devido às suas ligações com
movimentos ativos de trabalhadores, a Internacional tornou-se uma organização
significativa. Karl Marx tornou-se uma figura importante na Internacional e
membro do seu conselho geral. Seguidores de Proudhon, os mutualistas,
opunham-se ao socialismo estatal de Marx, advogando o abstencionismo político e
o arrendamento de pequenas propriedades.
Em 1868, seguindo a sua
mal-sucedida participação na Liga da Paz e Liberdade, o revolucionário russo
Mikhail Bakunin e as suas associações anarquistas coletivistas juntaram-se à
Primeira Internacional (que tinha decidido não se envolver com a Liga da Paz e
Liberdade). Eles aliaram-se com as seções socialistas federalistas da
Internacional, que advogavam o fim do estado através da revolução e a
coletivização da propriedade.
Em 1872, Bakunin e James
Guillaume foram expulsos da Internacional e as suas sedes transferiram-se para
Nova Iorque. Em resposta, as partes federalistas formaram a sua própria
Internacional no Congresso de St. Imier, adotando um programa anarquista
revolucionário.
2.8.
O Método Anarquista
Conforme
exposto, os anarquistas, independentemente da escola a que se filiara,
concordavam que toda instituição dotada de poderes impedia o alcance da
liberdade. Dessa forma, o Estado, a Igreja e muitos costumes são criticados na
condição de verdadeiros entraves para o alcance de um mundo regido por pessoas
livres.
Paralelamente
a isso, por meio da extinção da propriedade privada se combateriam as
diferenças que identificam as classes sociais, pois, consequentemente, em uma
sociedade desprovida de Estado, a produção e o gerenciamento das riquezas
seriam estipulados por meio de ações cooperativistas.
Nesse
contexto, todos alcançariam condições de possuírem uma vida minimamente
confortável e ninguém teria sua força de trabalho explorada em benefício de um
terceiro.
Então,
a violência e a miséria dariam lugar para um novo mundo regido pela felicidade
da ampla maioria.
Embora,
comunguem com os socialistas em alguns pontos sócio-políticos, os anarquistas,
em que pesassem acreditar na expressa e urgente necessidade de se realizar um
movimento revolucionário que combatesse as autoridades vigentes, não
concordavam os seguidores de Marx que uma ditadura do proletariado fosse
realmente necessária para que a sociedade comunista fosse alcançada. Porque em
na visão libertária, defendida pelos anarquistas, a substituição de um governo
por outro somente fortaleceria novas formas de repressão e desigualdade.
Neste
ponto, o Anarquismo difere do Marxismo por rejeitar o uso instrumental do
Estado para alcançar seus objetivos e por prever uma Revolução Social de
caráter direto e incisivo, ao contrário da progressão sócio-política gradual,
o Socialismo Científico, que antevia
como necessária a caminhada revolucionária gradativa rumo à derrubada do Estado
e, por fim, a instauração do comunismo com a superação inevitável, segundo Karl
Marx, dos antagonismos sociais pela Ditadura do Proletariado.
Portanto,
concluindo, o anarquismo se opõe ao comunismo porque não concebe que, após uma
revolução operária que ambos possam protagonizar, seja implantado o governo do
Estado por um partido político, mesmo que seja apenas numa primeira fase,
quando partidos, e também o próprio Estado, deveriam ser simplesmente abolidos,
de imediato e não mais tarde, ao passo que toda propriedade passasse
imediatamente a ser gerida por "comissões de trabalhadores".
2.9. Os Princípios
Anarquistas:
Assim
como toda Ciência Política e Filosófica, o Anarquismo possui também suas
principiologia doutrinária e terminológica.
Dentre
os princípios, destacam-se:
2.9.1. Princípio da
não doutrinação
Os anarquistas acreditam no
desenvolvimento heterodoxo do pensamento e do ideal libertário como um todo,
não idolatrando nem privilegiando qualquer escritor ou teórico desta vertente
de estudos.
|
|
|
Toda
a posição do anarquismo é completamente diferente de qualquer outro movimento
socialista autoritário. Ela tolera variações e rejeita a ideia de gurus
políticos ou religiosos. Não existe um profeta fundador a quem todos devam
seguir. Os anarquistas respeitam seus mestres, mas não os reverenciam, e o que
distingue qualquer boa compilação que pretenda representar o pensamento
anarquista é a liberdade doutrinária com que os autores desenvolveram ideias
próprias de forma original e desinibida. (George Woodcock).
Anarquismo não é doutrina,
não é religião, portanto não reverencia nenhuma espécie de livros ou obras
culturais, nem linhas metodológicas rígidas, o que o definiria infantilmente
enquanto ciência constituída.
As obras concernentes ao
anarquismo são, no máximo, fontes de experiências delimitadas histórica e
conjunturalmente, passíveis de infinitas adaptações e interpretações pessoais.
Em síntese, o anarquismo é
convencionado entre os libertários como sendo a emergência de um sentimento
puro, sob o qual cada adepto deve desenvolver dentro de si mesmo o seu próprio
instrumental intelectual para legitimá-lo e, mais do que isso, potencializá-lo
abstrata e concretamente.
2.9.2. A revolução social
Na ótica anarquista, a
revolução social consistiria na quebra drástica, rápida e efetiva do Estado e
de todas as estruturas, materiais e não materiais, que o regiam ou a ele
sustentavam. Este princípio é primordial na diferenciação da vertente de
pensamentos libertária em relação a qualquer outra corrente ideária.
É a diferença básica entre o
socialismo libertário e o socialismo autoritário.
Não há no Anarquismo, como
na ótica do Marxismo, a necessária instrumentalização do Estado para a
prossecução planejada, detalhada e gradativa da revolução, sendo instituída a
ditadura do proletariado para o controle operário dos meios de produção até a
eclosão do comunismo.
Ao contrário, para o
ideário anarquista, a revolução deve ser imediata, para não permitir que os
elementos revolucionários possam ser corrompidos pela realidade estatal.
De acordo com os
libertários, a ditadura do proletariado nada mais é do que uma ditadura
"de fato", continuando a exercer coerção, opressão e violência sobre
a sociedade. Por isso, segundo os libertários, a revolução social deve ascender
o mais rápido possível à sociedade anarquista, ao comunismo puro, para, através
dos princípios da defesa da revolução, não permitir a ressurreição do Estado.
Por fim, por intermédio do
processo de destruição completa do Estado, sobre todas as suas formas, torna-se
plenamente tangível a liberdade, podendo o sujeito renovar de forma efetiva os
seus princípios e preceitos humanistas.
2.9.3. Humanismo
Os anarquistas, de forma
geral, rejeitam a hipótese de que o governo ou o Estado sejam necessários ou
mesmo inevitáveis para a sociedade humana. Os grupos humanos seriam
naturalmente capazes de se auto-organizarem de forma igualitária e não
hierárquica, mediante os progressos originados pela educação libertária.
A presença de hierarquias
baseadas na força, ao invés de contribuírem para a organização social, antes a
corrompem, por inibirem essa capacidade inata de auto-organização e por dar
origem à desigualdade.
Destarte, a partir da
conscientização, aceitação e internalização da sua essência humana, ideia
suprimida anteriormente pelo Estado, segundo os anarquistas, emerge
naturalmente na sociedade humana o anseio pela ascensão da ideia base de
qualquer forma de vida real: a Liberdade.
2.9.4. A Liberdade
A Liberdade é a base
incontestável de qualquer pensamento, formulação ou ação anarquista,
representando o elo sublime que conjuga de forma plena todos os anarquistas.
Assim, entre os anarquistas, a Liberdade deixa o plano abstracional (do
pensamento) para ganhar uma funcionalidade prática, sendo o símbolo e a
dinâmica do desenvolvimento humano real.
Em outras palavras, o
princípio básico para qualquer pensamento, ação ou sociedade ser definida como
anarquista é que esteja imersa, tanto abstrata (ideologicamente), quanto
pragmaticamente (no âmbito das ações), no conceito de Liberdade.
Liberdade física, de gênero,
de pensamento, de ação, de expressão, de usufruto consciente dos recursos
humanos, sociais e naturais, de negociação e interação, de apoio mútuo, de
relacionamento e vinculação sentimental, de fé e espiritualidade, de produção
intelectual e material e de realização coletiva e pessoal.
Para a encarnação da
Liberdade, no entanto, é necessária a erradicação completa de qualquer forma de
autoridade.
2.9.5. O Antiautoritarismo
O Antiautoritarismo consiste
na repulsa e no combate total a qualquer tipo de hierarquia imposta ou a
qualquer domínio de uma pessoa sobre a(s) outra(s), defendendo uma organização
social baseada na igualdade e no valor supremo da liberdade.
Tem como principais, mas não
são os únicos objetivos, a supressão do Estado, da acumulação de riqueza
própria do capitalismo e das hierarquias religiosas. Sendo para o libertário, a
supressão dessa autoridade será condicionada pela ação direta de cada indivíduo
livre, prescindindo-se completamente de qualquer intermediário entre o seu
objetivo, enquanto defensor da Liberdade, e a sua vontade.
O anarquista entende que "enquanto houver autoridade, não haverá
liberdade".
2.9.6. Ação direta
Os anarquistas afirmam que
não se deve delegar a solução de problemas a terceiros, mas antes, atuar
diretamente contra o problema em questão, ou, de forma mais resumida, "A
luta não se delega aos heróis". Sendo assim, rejeitam meios indiretos
de resolução de problemas sociais, como a mediação por políticos e/ou pelo
Estado, em favor de meios mais diretos como o mutirão, a assembleia (ação
direta que não envolve conflito físico), a greve, o boicote, a
desobediência civil (ação direta que pode envolver conflito físico), e, em
situações excepcionais a sabotagem e outros meios coercitivos (ação direta com
potencial violento).
No entanto, a Ação Direta,
por si só, não garante a manutenção e a perpetuação das condições humanas
básicas, tanto em termos estruturais, quanto no aspecto intelectual,
necessitando de uma extensão operacional extensa e organizada a fim de fazer,
da força humana global, uma só energia coletiva. Decerto, somente a
solidariedade e o mutualismo máximos podem promover essa harmonia social.
2.9.7. Apoio mútuo
Os anarquistas acreditam que
todas as sociedades, quer sejam humanas ou animais, existem graças à vantagem
que o princípio da solidariedade garante a cada indivíduo que as compõem. Este
conceito foi exaustivamente exposto por Piotr Kropotkin, em sua famosa obra
"Mutualismo: Um Fator de Evolução". Da mesma forma, acreditam que a
solidariedade é a principal defesa dos indivíduos contra o poder coercitivo do
Estado e do Capital.
Mas, para que a
solidariedade se torne uma virtude "de fato" é necessária a
erradicação de qualquer fator de segregação ou discriminação humanas. Com esse
objetivo, o internacionalismo se firma enquanto o princípio proeminente da
integração sociolibertária.
2.9.8. Internacionalismo
Para os anarquistas, todo
tipo de divisão da sociedade que não possua uma funcionalidade plena no campo
humano deve ser completamente descartada, seja pelos antagonismos infundados
que ela gera, seja pela burocracia contraproducente que ela encarna na
organização social, esterilizando-a. Logo, a ideia de "pátria" é
negada pelos anarquistas.
Os libertários acreditam que
as virtudes e o exercício pleno delas não devem possuir "fronteiras".
E que a natureza humana é a mesma em qualquer lugar do mundo, exigindo,
independentemente do universo material ou cultural onde o ente humano esteja
inserido, uma gama infinita de necessidades e cuidados. Em outras palavras: se
a fragilidade do homem não tem fronteiras, por que estabelecer empecilhos ao
seu auxílio?
Vale lembrar que o conceito
libertário de internacionalismo se difere completamente do conceito que
conhecemos capitalista de globalização.
Globalização é a ampliação a
nível mundial da difusão de produtos ideológicos culturais e materiais de
determinados segmentos capitalistas, visando à potencialização máxima da
capacidade mercadológica dos agentes operantes, ou seja, o “lucro máximo”.
Por outro lado, o
internacionalismo, por se alijar completamente de todo o ideário capitalista,
não possui nenhuma intenção lucrativa, capitalista, e não é permeado por
estruturas privilegiadas de produção como as indústrias capitalistas e, sim,
pela solidariedade e mutualismo máximos.
Didaticamente, o
internacionalismo pode ser definido como sendo a difusão global de
"serviços" humanos, e a globalização como a difusão global de
"hegemonias" mercadológicas.
2.9.9. Princípio da
flexibilidade e naturalidade organizacionais
Os anarquistas, por
intermédio da aceitação e compreensão da progressão materialmente dialética da
história, em sua maioria, não acreditam que o estabelecimento de estruturas
organizacionais rígidas possam promover um desenvolvimento humano
efetivo.
Assim, acreditam que a
inflexibilidade organizacional - típica do sistema capitalista - termina por
interferir deleteriamente, quando não suprime, as faculdades individuais de
cada ser humano.
Por isso, os anarquistas
acreditam que são as dificuldades e problemáticas humanas, materiais e sociais
que devem prescrever o modelo temporário de organização, e não as inferências
provenientes de abstrações técnicas.
Em outras palavras, é a
realidade concreta que deve definir as bases da organização da sociedade
anarquista, em contrapartida com as situações imaginárias criadas pelos
"técnicos", as quais, na maioria das vezes, tendem a ser manipuladas
a favor de interesses parciais.
E isso só seria possível por
meio do Federalismo Libertário.
2.9.10. Federalismo
Libertário
Ampliação funcional do
princípio da "Ação Direta", o federalismo libertário é o meio de
organização proposto pela maior parte das vertentes anárquicas, desenvolvido,
no âmbito anarquista, pela primeira pessoa a se intitular “anarquista”:
Pierre-Joseph Proudhon (1809 - 1865).
Esse conceito consiste na
subdivisão organizacional temporária ou permanente da sociedade libertária – em
federações, comunas, confederações, associações, cooperativas, grupos e
qualquer outra forma de conjugação da força operacional humana – para a maior
eficiência das interações humanas, sociais.
Por intermédio do
federalismo, de cunho libertário, seria possível uma intervenção rápida e
direta do homem frente às problemáticas emergentes na sociedade anarquista.
Nesse aspecto, Piotr Alexeevich Kropotkin (1842 – 1921) aludia didaticamente às
federações como sendo "botes salva-vidas": ágeis no auxílio e
versáteis frente às condições ou necessidades adversas.
Evidencia-se que o conceito
de federalismo, no campo libertário, transcende o conceito atual de federalismo
que conhecemos, deixando de representar apenas as associações de grande escala
para adentrar no âmbito pessoal, abrangendo, inclusive, as relações
interpessoais.
Desta forma, o federalismo
libertário se firma enquanto a máxima coesão entre o homem e a satisfação
proficiente de suas necessidades.
Em outras palavras, o
federalismo libertário é tido enquanto o germe de qualquer organização
anarquista.
2.9.11. Responsabilidades:
individual e coletiva
Na sociedade anarquista, a
questão da responsabilidade é persecutória em qualquer pensamento acerca das
relações entre os seus integrantes. Didaticamente, ela é dividida entre
responsabilidade individual e responsabilidade coletiva - ambas totalmente
coesas na prática.
Pela primeira, compreende-se
a consciência individual encarnada em qualquer ação empreendida pelo indivíduo,
de forma pessoal, subjetiva - embora com vistas ao benefício do coletivo.
Assim, o anarquista possui seus deveres e obrigações em relação a toda a
sociedade, agindo sempre de forma a fazer progredir a sociedade por completo.
Pela segunda, é
convencionada a consciência coletiva emergente a partir de qualquer ação
exercida por determinada seção operacional - grupo, associação, federação, etc.
Uma determinada seção é responsável - em sua integridade - pelas suas ações
desenvolvidas, estando suscetível aos seus resultados e, consequentemente, às
possíveis reformulações ou reorientações.
2.9.12. Propaganda pelo ato
A
propaganda pelo ato era uma tática utilizada por anarquistas no século XIX que
consistia na divulgação de atos violentos de retaliação contra os
contrarrevolucionários com o propósito de se fazer ecoar com mais força,
chegando a um número maior de trabalhadores, a luta e o ideário anarquista.
Por
volta dos anos 1880, a frase "propaganda pelo ato" tinha começado e
ser utilizada tanto dentro quanto fora do movimento anarquista para se referir
a bombardeios individuais. Porém, anarquistas como Kropotkin passou a advogar o abandono desse tipo de
táticas em favor de uma ação coletiva revolucionária, por exemplo, através do
movimento sindical..
Então,
os anarquistas contemporâneos adotaram métodos alternativos de ação direta como
a não violência, contra economia e criptografia anti-estado para trazer uma
sociedade anarquista.
A
diversidade no anarquismo tem levado a usos muito diferentes de termos
idênticos entre diferentes tradições anarquistas, o que tem levado a muitos
interesses na definição da teoria anarquista.
3.1.
Pedagogia Libertária:
A questão persecutória por
excelência entre os anarquistas no decorrer da história é: como seria possível
uma Sociedade Anarquista se cada ser humano pensa de uma forma diferente? Não
seria permeada por inúmeros conflitos, guerras, antagonismos?
A resposta a essa questão,
defendida pela maior parte dos anarquistas, é a de que apenas o desenvolvimento
virtuoso da educação (Pedagogia Libertária) – permeada pela autodidática,
interesse natural, relativismo cultural e antidogmatismo – proveria as pessoas
do desenvolvimento humano efetivo.
Assim, embora os conflitos
façam parte da Sociedade Anarquista – e a desenvolvam estruturalmente por essa
relação dialética –, eles seriam transferidos do plano físico – como é o caso
das guerras atuais – para o plano do diálogo – como prima a democracia direta
–, sendo negociados de forma pacífica, consciente, racional e, acima de tudo,
humana, já que o interesse, o calculismo, não estaria mais regendo as
instâncias conflitivas.
Em outras palavras,
independentemente do resultado do embate, ninguém sairia em posição
privilegiada.
3.2. Educação libertária
Max
Stirner escreveu em 1842 um longo ensaio sobre a educação chamado O Falso
Princípio da nossa Educação. Nele, Stirner nomeia o seu princípio
educacional como "personalista”, explicando que o auto-entendimento
consiste em autocriação contínua.
Educação,
para ele, é criar "homens livres, caráteres soberanos", pelos quais
ele quer dizer "caráteres eternos... que são, portanto, eternos porque
eles formam-se a cada momento".
Outra
tradição libertária é a de não escolarização e a pedagogia libertária nas quais
atividades lideradas por crianças substituem abordagens pedagógicas.
Experiências na Alemanha levaram A. S. Neill a fundar o que se tornou a
Summerhill School em 1921.
Summerhill
é frequentemente citada como um exemplo do anarquismo em prática, apesar
de não advogar uma abordagem
manifestadamente política em relação à luta de classes.
Além
de organizar escolas de acordo com princípios libertários, anarquistas também
continuaram a questionar o conceito de aprendizagem por si.
O
termo desescolarização foi popularizado por Ivan Illich, que argumentava que a
escola como uma instituição é disfuncional para a aprendizagem autodeterminada
e serve, ao contrário, para a criação de uma sociedade de consumo.
3.3. Anarquismo no Brasil
No
Brasil, o anarquismo teve o seu início por volta de 1850 graças à influência de
imigrantes vindos da Europa. Atingiu o seu ponto mais alto no século XX, pois
era uma doutrina muito apreciada entre as classes operárias, o que gerou as
grandes greves em São Paulo e Rio de Janeiro, em 1917, 1918 e 1919.
Apesar
de ainda existirem no Brasil alguns movimentos anarquistas, estes não possuem a
mesma relevância de outros tempos.
Talvez
uma das primeiras experiências anarquistas do mundo tenha ocorrido nas margens
da Baía de Babitonga, na cidade histórica de São Francisco do Sul. Em 1842 o
Dr. Benoit Jules Mure, inspirado nas teorias de Fourier, instala o Falanstério
do Saí ou Colônia Industrial do Saí, reunindo os colonos vindos de França no
Rio de Janeiro em 1841.
Houve
dissidências e um grupo dissidente, à frente do qual estava Michel Derrion,
constituiu outra colônia a algumas léguas do Saí, num lugar chamado Palmital: a
Colônia do Palmital.
Mure
conseguiu apoio do Coronel Oliveira Camacho e do presidente da Província de
Santa
Catarina,
Antero José Ferreira de Brito. Este apoio foi-lhe fundamental para
posteriormente conseguir a ajuda financeira do governo do Império do Brasil
para seu projeto.
Em
1889 Giovani Rossi tentou fundar em Palmeira, no interior do Paraná, uma
comunidade baseada no trabalho, na vida e na negação do reconhecimento civil e
religioso do matrimônio, (o que não significa, necessariamente, "amor livre"),
denominada Colônia Cecília. A experiência teve curta duração.
O
partido Comunista Anarquista ficou menos influente com a criação do Partido
Comunista em 1922 por ex-integrantes do movimento anarquista que, influenciados
pelo sucesso da revolução Russa, decidem fundar um partido segundo os moldes do
partido bolchevique russo.
Porém,
esta posição, sustentada por muitos historiadores, vem sendo contestada desde a
década de 1970 por Edgar Rodrigues (anarquista português naturalizado no
Brasil, pesquisador autodidata da história do movimento anarquista no Brasil e
em Portugal), e pelos recentes estudos de Alexandre Samis que indicam que a
influência anarquista no movimento operário cresceu mais durante este período
do que no já fundado (PCB) e só a repressão do governo de Artur Bernardes,
viria diminuir a influência das ideias anarquistas no seio do movimento
grevista.
Artur
Bernardes foi responsável por campos de concentração e centros de tortura, nos
quais morreram inúmeros libertários, sendo que o pior de tais campos foi o de
Clevelândia, localizado no Oiapoque.
Edgar
Rodrigues apresenta em várias de suas obras as investidas de membros do PCB
que, procurando transformar os sindicatos livres em sindicatos partidários e
conquistar devotos às ideias leninistas, polemizavam em sindicatos e jornais,
chegando a realizar atentados contra anarquistas que se destacavam no movimento
operário brasileiro, durante a década de 1920.
Provavelmente
devido aos problemas de comunicação resultantes da tecnologia da época, os
anarquistas só terão compreendido a revolução russa de forma mais clara, a
partir das notícias de célebres anarquistas, como a estadunidense Emma Goldman,
que denunciara as atrocidades cometidas na Rússia em nome da ditadura do
proletariado.
Seria
a partir deste momento histórico que se definiria a posição tática do
anarquismo perante os socialistas autoritários no Brasil, separando a confusão
ideológica que reinava em torno da revolução russa, identificada pelos
anarquistas inicialmente como uma revolução libertária.
Esta
ideia seria depois desmistificada pelos anarquistas, que acreditam no
socialismo sem ditadura, defendendo a liberdade e a abolição do Estado.
Durante
o Regime Militar (1964-1985), as principais expressões anarquistas no Brasil
foram o Centro de Estudos Professor José Oiticica, no Rio de Janeiro, o Centro
de Cultura Social de São Paulo e o Jornal O Protesto no Rio Grande do Sul.
Todos foram fechados no final da década de 1960, mas seus militantes
continuaram se encontrando clandestinamente, publicando livros e se
correspondendo com libertários de outros países.
Na
década de 1970 surge na Bahia o jornal O Inimigo do Rei, impulsionando a
formação de novos grupos anarquistas, através das editorias autogestionárias,
em várias partes do Brasil.
No
Rio Grande do Sul, nos anos oitenta, cria-se na cidade de Caxias do Sul, o
Centro de Estudos em Pesquisa Social - CEPS, voltado para o trabalho social. No
ano de 1986, na cidade de Florianópolis, é realizada a Primeira Jornada Libertaria
com o lançamento das bases para a reorganização da Confederação Operária
Brasileira - COB/AIT e a organização dos anarquistas.
4.0. LEITURAS
SUGERIDAS
Aceito
com entusiasmo o lema “O melhor governo é o que menos governa”; e gostaria que ele
fosse aplicado mais rápida e sistematicamente. Levado às últimas
conseqüências, este lema significa o seguinte, no que também creio: "O
melhor governo é o que não governa de modo algum”. (Henry David Thoreau)
História das idéias e
movimentos Anarquistas, vol. 1 - George Woodcock
Este
volume trata especialmente da ideia que o Anarquismo tem e produz durante o
século XIX por Proudhon, Liev Tolstoi, Bakunin, William Morris,
Kropotkin, Malatesta, Godwin e tantos outros. E por que toda iniciativa de uma
aliança com o socialismo de Marx sempre falhou.
História das idéias e
movimentos Anarquistas, vol. 2 - George Woodcock
Já
o segundo volume aborda o movimento nos países em que o Anarquismo foi
predominante: França, Espanha, Itália, Rússia e um capítulo pouco breve que
trata na América Latina, norte da Europa, Inglaterra e Estados Unidos.
Como
as ideias dos grandes escritores incentivaram tantos povos a lutar pela
valorização do indivíduo, sua liberdade e cooperação.
Notícias de Lugar Nenhum -
William Morris
O
autor descreve com realismo uma sociedade justa e livre na qual máquinas
permitem que os homens se libertem do trabalho tedioso e se dediquem a uma
atividade livre, criadora e, sobretudo, prazerosa.
Algumas
referências deste livro na internet falam do em como seria uma sociedade após
uma revolução socialista, mas, engano, a sociedade abordada é anarquista.
O reino de Deus está em vós
- Liev Tostoi
Tolstoi
defende neste livro a ideia de que o cristianismo não é uma doutrina abstrata,
mas uma proposta prática para vida. Logo depois de lançado, em 1894, este livro
gerou tanta polêmica que foi vetado pelo czar, e seu autor excomungado pela
Igreja Ortodoxa Russa. O livro ficou desaparecido por cem anos.
Diálogo imaginário entre
Marx e Bakunin - Maurice Cranston
Uma
conversação que supostamente mantiveram os dois homens que dominaram sua época
na política durante o encontro que tiveram em Londres em 1864. O autor
esforçou-se para reconstituir, a partir das teses particulares desenvolvidas
pelos dois pensadores, a controvérsia que há entre Socialismo e Anarquismo.
Entre camponeses - Malatesta
Os
poetas que escrevem livros sobre prazeres à vida do campo nunca lavraram a
terra, enquanto os cultivadores matam-se de fadiga, morrem de fome, vivem pior
que os animais e são tratados como gentalha, de tal modo que o último vagabundo
das cidades sinta-se ofendido ao ser tratado de camponês. Mas quem de nós
gostaria de abandonar o campo se trabalhasse por sua conta e encontrasse no
trabalho da terra, bem-estar, liberdade e respeito?
Deus e o Estado - Bakunin
A
obra aborda com grande crítica o que o conceito de religião e Estado provoca no
indivíduo diminuindo-o e reprimindo-o frente a si mesmo e sociedade. Apresentando
que a verdadeira escola para o povo e para todos os homens feitos é a vida,
onde a única autoridade que pode-se respeitar é aquela do espírito coletivo e
público de uma sociedade fundada no respeito mútuo de todos os seus membros.
A Alma do homem sob o
socialismo - Oscar Wilde
Este
estudo, apesar de apresentar-se como socialismo, demonstra que a autoridade,
seja ela qual for, e a propriedade estão na origem de todas as deformações
sociais.
Guerra e Paz - Liev Tolstoi
Claro
que este livro não poderia faltar nesta lista. Uma obra extensa, próxima de
1.000 páginas, publicado em partes na revista Mensageiro Russo, entre 1865 e
1869. Apresentando a sociedade russa durante o tumultuado período das guerras
napoleônicas, de 1805 (ano da vitória de Napoleão na batalha de Austerlitz) a
1812 (quando ocorrerram a célebre retirada dos franceses durante o inverno e o
incêndio de Moscou). Como fio condutor, temos a vida, as misérias e os amores
de duas grandes famílias aristocratas.
Inquérito sobre a Justiça
Política - William Godwin
Godwin
argumenta que o governo é uma força corruptora na sociedade perpetuando a
dependência e a ignorância e sua permanência se torna cada vez mais
desnecessário e gradualmente despossuído do poder pela difusão do conhecimento.
A propriedade é um roubo -
Proudhon
Um
dos livros mais aclamados para apreciadores desta leitura. Joseph Proudhon
apresenta e apoia a ideia do Anarquismo pacífico que aconteceria de maneira
gradual nas organizações coletivas, onde o indivíduo não necessitaria mais da
ação governamental capitalista e religiosa, extinguindo-o progressivamente. E
apresenta como a sociedade seria nesse novo meio.
Desobediência Civil - Henry
David Thoreau
Throreau
abordava o Anarquismo pacífico também e exemplificava em suas ações, pois este
livro foi escrito enquanto estava na prisão por discordar de pagar os impostos
do Governo. A Desobediência civil é a Bíblia dos libertários. Tão
poderoso que, anos mais tarde, nas mãos de Gandhi, serviu para derrubar um império.
Nenhum comentário:
Postar um comentário